Quando alguém comete um fato que consta no Código Penal ou em outra lei penal, é comum crer automaticamente que trata-se de um crime, todavia, em alguns casos mesmo a conduta estando prevista em lei ela não será considerada ilícita e, portanto, não será crime.
As hipóteses em que o cometimento de fato típico não será considerado crime são as denominadas Causas Excludentes de Ilicitude, as quais estão previstas no artigo 23 do Código Penal.
Dentre as mencionadas causas tem-se o Estado de Necessidade, o qual ocorre, segundo Nidal Ahmad, quando alguém frente a um perigo atual e não causado por ele, cujo não possui qualquer dever legal de enfrentar, ou seja, não é uma autoridade policial, sacrifica um bem jurídico (aquilo que se busca proteger pela lei penal, como a vida, patrimônio, etc.) alheio para salvar bem jurídico próprio ou de terceiro[1]. Ressalta-se que ambos os bens jurídicos devem ser legítimos, havendo assim a existência de um conflito entre eles.
Tal situação pode ser exemplificada pela seguinte hipótese: Um indivíduo A ateia fogo em seu próprio apartamento para receber o dinheiro do seguro e no momento da fuga perceber que a única porta de saída encontra-se bloqueada pelas chamas. Nessa situação, ele tenta sair do local pela janela por meio de uma corda, momento no qual ele nota que o indivíduo B também estava no apartamento. O indivíduo B, percebendo que não conseguiria sair do local a tempo caso ele esperasse o indivíduo A descer, empurra o indivíduo A e apossa-se da corda saindo do apartamento e deixando consequentemente o indivíduo A para morrer[2].
Assim, a conduta do indivíduo B encontra-se abarcada pelo Estado de Necessidade, sendo que o fato dele ter emburrado o individuo B e o deixado para morrer não configurará crime de homicídio.
Entretanto, para que o Estado de Necessidade seja configurado deve-se atentar a alguns requisitos que precisam estar presentes:
a) Situação de perigo atual: o indivíduo precisa estar frente a um perigo contemporâneo provocado por ação humana, animal ou a própria natureza;
b) Ameaça a direito próprio ou alheio: A vida, patrimônio, integridade física, etc, da pessoa ou de terceiro estão sendo ameaçadas;
c) Não ser o indivíduo quem causou a situação de perigo;
d) Inexistência de dever legal de enfrentar o perigo: exemplo de bombeiro que não pode deixar de entrar em imóvel incendiado para não se queimar, ou seja, sofrer lesões corporais;
e) Inexigibilidade de auto sacrifício: tem que haver proporcionalidade entre a conduta tomada pelo indivíduo e a ameaça sofrida, que justifique ele não ter que sacrificar algo. Exemplo: Não é proporcional cometer homicídio para defender patrimônio de baixo valor, respondendo o agente nesse caso pelo homicídio perpetrado[3].
Conclusão
Para uma correta identificação da conduta e possibilidade de exclusão do crime faz necessário o acompanhamento do caso por um bom profissional, posto que somente ele poderá se atentar a existência de Causas Excludentes da Ilicitude como o Estado de Necessidade.
Fonte: AHMAD. Nidal. Direito Penal: teoria e prática. 5. ed. rev., amp. e atual. São Paulo: Editora Juspodivm, 2022.
Autores: Beatriz Amanda Cardoso, Graduanda em Direito na UEL.
Sérgio Luiz Barroso, Advogado inscrito na OAB/PR 76.020.
[1] AHMAD. Nidal. Direito Penal: teoria e prática. 5. ed. rev., amp. e atual. São Paulo: Editora Juspodivm, 2022. p. 143.
[2] Idem. p. 144.
[3] Idem.
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